MITOS
O mito conta uma historia sagrada, quer dizer, um acontecimento primordial que teve lugar no começo do Tempo. Contar uma historia sagrada equivale a revelar um mistério porque os personagens do mito não são seres humanos, são deuses ou heróis civilizadores, e os homens só podem conhecê-los porque suas histórias foram “reveladas”. Uma vez revelado – assumido como tal – o mito se apresenta como verdade absoluta, inquestionável.
Narrando como as coisas vieram à existência, o homem explica-as e responde indiretamente a outra questão: por que elas vieram à existência. O porquê insere-se sempre no como. E isso ocorre em função de o mito revelar a irrupção do sagrado no mundo, causa última de toda existência real.
Nos mitos se apresentam formulações tradicionais de antiguidade quase sempre difícil de estimar. Nesse nível, os mitos são conhecimentos tribais transmitidos, através de reiteradas narrações, de uma geração a outra. Eles têm uma significação vital. Não somente representam mas também são a vida psíquica da tribo primitiva, que se desintegra e percebe instantaneamente ao perder a herança mítica, como o homem que perdeu a alma. A mitologia de um povo é sua religião viva, cuja perda é sempre e em toda parte, mesmo no caso do homem civilizado, uma catástrofe moral.
Em virtude dos mitos, o homem só se reconhece verdadeiramente homem na medida em que imita os deuses, os heróis civilizadores ou antepassados míticos. O homem religioso é alguém que se faz a si próprio, na medida em que procura imitar os deuses ou a orientação que deles provém.
Os mitos são instrumentos de crença para os que os aceitam e por eles pautam suas vidas. A crença, essencial à aceitação do mito, explica-lhe a afetividade num determinado contexto cultural. Se não há homens concretos pautando suas existências por certos significados culturais,estes se tornam coisa morta, quando muito, lembrança do passado. O próprio fato da crença supõe que, subjetivamente, isto é, para quem acredita, o objeto da crença não é mitológico.
Desse modo, embora se possa falar do “mito de Adão e Eva”, pois hoje predomina a noção cientifica da evolução homínida, para muitos Adão e Eva são realidade histórica e não uma forma simbólica de tratar da criação do mundo. Tanto é assim que, nos Estados Unidos, os crentes fundamentalistas, para quem a Bíblia deve ser entendida ao pé da letra, conseguiram garantir judicialmente que nas escolas de determinadas locais sejam ensinadas as duas teorias: a do evolucionismo e a da criação com Adão e Eva.
Para quem acredita, os mitos não são realmente mitos, no sentido de elaborações culturais, senão verdades. Portanto a não crença em determinada narrativa, tradição ou explicação é essencial a sua avaliação como mito, da mesma forma que a crença em sua avaliação como mito, da mesma forma que a crença em sua verdade e validade é essencial a sua aceitação como elemento efetivo de cultura. Não existe o mito por si mesmo.
Parece mais útil, em vez de considerar esse assunto uma falsidade, perceber que os mitos são repositórios de alguma das mais belas tentativas feitas pelos povos, em todo o decorrer da historia, para dar significado aos problemas da condição humana.
Os mitos são, portanto, uma linguagem, uma forma de interpretar a existência e, assim, sua “verdade” está na capacidade que tenham de orientar os homens em suas trilhas.
Bibliografia: Mircea Eliade – O sagrado e o Profano: Introdução e Capitulo 1 – pg. 13 a 57
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