O INDIVIDUALISMO NA FÉ?
QUAL A CRÍTICA TEOLÓGICA QUE SE PODERIA FAZER AO EXARCEBADO INDIVIDUALISMO VIGENTE ENTRE OS EVANGÉLICOS E CATÓLICOS BRASILEIROS?
Falar de individualismo vigente entre evangélicos e católicos é restringir um problema social que envolve a quase totalidade da nossa sociedade. Sociedade essa marcada com sua riqueza de diversidade multicultural, e de várias tendências inclusive a religiosa, nesse contexto estão imersos católicos e evangélicos. O problema assim apresentado nos aponta para uma parte da sociedade, no caso, pessoas que professam sua fé, católicos e evangélicos apenas para citar os que, aqui, está em questão, os quais são atingidos de cheio por essa cultura dominante, que em nossa época se predomina o individualismo, o exclusivismo, o egoísmo, o sensacionalismo, o modismo, o comodismo, e de tantos outros “ismos” que compõe, a meu ver, dois aspectos importantes para nossa compreensão. É a partir desses aspectos que construo minha crítica, dessa fragmentada, e empobrecida visão de sociedade, são eles: 1) A fragilidade da percepção do relacionamento humano e, 2) nossa debilidade diante da grandeza da vida.
1) A fragilidade da percepção do relacionamento humano está ancorada numa mentalidade de massificação das pessoas, mentalidade essa adestrada no desejo de “usar” as relações, como meios, para se obterem vantagens e proveitos próprios, como chavão para essa idéia temos a “lei de Gérson” que nos diz: “que o importante é levar vantagem em tudo, certo!” Logo, ao me relacionar com o outro eu não vejo um outro, mas sim uma coisa, e as coisas não tem sentimentos nem desejos ou vontades, em meu ato relacional com coisas não existe o ato dialógico, pois as coisas não falam. Nesse sentido o individualismo, que é a expressão mais egoísta e solitária do humano, se aflora e é externada com doses de loucura. Assim sendo, o humano não se humaniza, pois o caminho da humanização passa pelo respeito ao próximo, pela solidariedade, pela partilha, e por todas aquelas ações que manifestam nossa dignidade de sermos filhos/as de Deus. Nos falta, portanto, o relacionamento estabelecido a partir da Alteridade, isto é, tratar o outro como um ser composto de desejos e necessidades (phatos = sentimentos, emoções), e que expressa, e ou manifesta através do reconhecimento e da importância do outro em minha vida. E será na relação de alteridade que temos a verdadeira percepção do relacionamento humano, é no trato com o outro, no estar com o outro no serviço, na promoção da justiça e na prática da caridade. Ações essas feitas a partir da experiência acolhedora da graça em minha vida, que me dão garantias de me encontrar com Deus através do outro (cf. Mt 25, 31ss.). Essas ações (obras) serão manifestações visíveis da minha fé que brota do amor fontal de Deus em minha vida. Só assim para podermos vencer o individualismo que nos divide (dya-bollos = dividir), e nos afasta de Deus, pois “quem não ama não conhece a Deus” (1 Jo 4,8). E essa reflexão nos leva ao segundo aspecto;
2) Nossa debilidade diante da grandeza da vida nos faz pensar que o mundo gira em torno de nós, e, portanto nós somos o centro do universo. Nossas atitudes denunciam nossas intenções, e parece que nossa vida resume-se no desejo de ajuntar o máximo possível de bens materiais. Trabalhamos o dia todo com a finalidade de conquistar nossos objetivos, enchemos nossa casa de toda tecnologia, e ainda assim sempre estamos insatisfeitos, precisamos de mais e mais. Compensamos nossa ausência, junto as nossas famílias, com presentes de última geração, e pensamos que isso é o suficiente. Crescemos acostumados a lutar por nossos objetivos, ainda que muitas vezes isso signifique o desrespeito aos outros, estabelecemos, desde a Idade Média, o paradigma da “conquista” (L. BOFF). Não crescemos com a idéia de conjunto, de união, de respeito, isto é, não estabelecemos ainda um novo paradigma, o do “cuidado” (L. BOFF), mesmo que essas idéias fossem refletidas, no fundo a mensagem subliminar, contida entre linhas, era de conquistar nosso espaço nem que seja a força. Não aprendemos a respeitar o meio em que vivemos como o espaço do outro, a natureza, etc. Segundo uma visão interesseira, o espaço público, meio ambiente, se torna espaço privado, e nessa esteira, esse espaço, seria apenas um cartão postal com uma grande possibilidade de ser explorada para gerar muito lucro a quem o conquistar. Em meio a tudo isso, a partir da nossa perspectiva religiosa, surge uma religião moralista, legalista, onde já não existe espaço para a graça de Deus, mas sim, uma religião engessada ditando regras, e nos impondo aquilo que se deve ou não fazer. Muitos indivíduos delegam sua capacidade de escolha, de crítica, pois foram acostumados a terem outras pessoas para pensarem por eles o tempo todo, de modo que agora não se segue mais a pessoa de Jesus, mas sim a essa ou aquela instituição, a esse ou aquele padre/pastor. A norma não é mais a Palavra de Deus, mas sim a palavra do líder religioso. Dessa forma cria-se uma religião que manipula o sagrado para tirar proveito próprio, e esses interesses muitas vezes são obscuros.
Acredito que podemos combater esse individualismo reinante a partir do resgate da proposta do Reino, onde a premissa pode ser: “Meu reino não é deste mundo”. (Jo 18, 36), isto é, a lógica do Reino de Deus não deve acompanhar a lógica da nossa sociedade. Dessa maneira podemos romper com esses modelos sociais que fazem das pessoas seres descartáveis, modelos que sufoca e mata a vida, modelos que geram anti-valores que se impõe e apresentam-se como uma “cultura de morte” (J. Paulo II). Podemos apresentar outro modelo, de sociedade, que inclua a todos, que dinamize a vida, que parte da condição da dignidade humana, onde o humano entra num processo radical de humanização, para quem sabe um dia esse mesmo humano possa chegar a sua “divinização”. Isto seria viver a humanidade em toda sua graça e profundidade numa relação íntima com o Amor e a gratuidade, marcas presente da relação de comunhão e participação do humano com o divino. .
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